UM NOVO TÍTULO DE OFICIAL DA ORDEM DAS ARTES E DAS LETRAS PARA A CULTURA PORTUGUESA
O nome de Joana Vasconcelos vem juntar-se, a partir de hoje, a uma galeria onde figuram, entre outros, Amália Rodrigues, António Vitorino de Almeida, Manoel de Oliveira, Maria Helena Vieira da Silva, Júlio Pomar, António Lobo Antunes, José Saramago, Joaquim Benite ou Tiago Rodrigues.
As insígnias, atribuídas desde 1957 pelo Ministério da Cultura francês, agraciam aqueles que se distinguiram pela sua criação e/ou influência nas artes e letras em França e no mundo. A cerimónia de entrega decorreu esta manhã no Palácio de Santos, sede da Embaixada de França em Portugal, pelas mãos da Senhora Embaixadora Florence Mangin, que proferiu o seguinte discurso:
«Senhora Ministra da Cultura, Cara Graça Fonseca / Chère Madame Joana Vasconcelos
Minhas Senhoras / Meus Senhores,
É com enorme prazer que vos recebo no Palácio de Santos para prestar homenagem a uma notável representante do mundo da arte contemporânea: Joana Vasconcelos.
A Ordem das Artes e das Letras é uma das quatros ordens ministeriais da República Francesa destinada a recompensar personalidades que se tenham distinguido através da sua obra em áreas artísticas e literárias ou, ainda, que tenham contribuído para o esplendor das artes e das letras em França e no mundo.
Começo por referir que Joana Vasconcelos tem com a França uma longa história de amor com declarações recíprocas constantemente renovadas. Porque foi em Paris que nasceu, numa altura em que a vida de muitos portugueses tinha sido perturbada pela ditadura. Quando a democracia voltou em 1974, voltou para Portugal com os seus pais. É assim que a língua francesa é sua, tanto quanto a portuguesa, e foi este bilinguismo precoce que a permitiu tornar-se numa verdadeira poliglota, mais um trunfo para a artista de renome internacional que se tornou. Cosmopolita, sem qualquer dúvida, muitas das suas criações estão profundamente enraizadas nos temas tradicionais portugueses, no saber e na cultura popular, no artesanato e na indústria criativa do país. Utilizando materiais mais comuns e alguns mais surpreendentes e inovadores, de ontem e de hoje, Joana Vasconcelos cria um mundo que nos surpreende pela dimensão, pela cor, pela mensagem, sem excluir a sua enorme originalidade para nosso grande deleite e prazer. E, nesse sentido, tomo a liberdade de citar o nosso renomado filósofo Gilles Lipovetsky que dedicou algumas páginas muito bonitas à sua obra, descrevendo-a nestes termos: "Uma banalidade trivial cuja inspiração toma emprestada temas e formas comuns e ainda liberta uma poesia intensa. Uma presença afirmada de tradição, terror, costume e que em nada exclui uma contemporaneidade exposta, uma arte do tempo presente, do mundo presente, na sua dimensão planetária e globalizada.” Desta obra poética, barroca, provocativa, mas também imbuída de humor, a França gosta e não se cansa, querida Joana Vasconcelos.
Em 2012, foi convidada a expor no Palácio de Versalhes; em 2018, o Museu de Arte Moderna e Contemporânea de Estrasburgo dedicou-lhe uma retrospectiva, enquanto o Hôtel Départemental des Arts de Toulon a recebeu com a sua exposição Exagérer pour Inventer. Em 2019, o Coeur de Paris torna-se na sua primeira obra permanentemente instalada no espaço público parisiense, na Porte de Clignancourt, no bairro onde nasceu. Depois, a sua exposição Branco Luz tomou majestosamente o Le Bon Marché Rive Gauche. Joana Vasconcelos é pioneira na representação da mulher: foi a primeira mulher a ter exposto no Château de Versailles em 2012, a ter representado Portugal, o seu país, na Bienal de Veneza em 2013, a ter sido objeto de uma retrospetiva no Museu Guggenheim em Bilbao em 2018, e assim por diante. E tudo isto por mérito próprio e em perfeita consonância com a energia que coloca na dignificação da imagem da mulher na sua obra. Se o seu feminismo não expressa nenhuma agressividade, você é, no entanto, uma excelente lutadora, como as valquírias que habitam o seu trabalho, essas deusas guerreiras que salvam os bravos durante os combates. Porque por trás das suas valquírias e do seu espírito feminista, se esconde uma verdadeira paixão, nutrida desde a infância, através do karatê, do qual é cinturão preto desde os 17 anos! Sem dúvida que herdou o espírito revolucionário dos seus pais, intelectuais progressistas. Assim, creio que ficará feliz em rever a obra de Gérard Fromager, intimamente ligada a este período do maio de 1968, a quem o Museu Berardo dedica uma retrospectiva, durante a abertura em Lisboa, da Temporada França-Portugal 2022, a partir de 16 de fevereiro. Espero que desfrutem desta exposição, tal como os visitantes franceses que irão descobrir, de maio a novembro de 2022, L’Arbre de Vie, um imponente loureiro (laurus nobilis), a sua nova obra especialmente concebida para a Sainte Chapelle de Vincennes, no âmbito da Temporada Cruzada França-Portugal 2022.
Mas hoje, para celebrar o seu talento e o vínculo profundo que nos une, querida Joana Vasconcelos, “em nome da República Francesa, fazemos de ti Oficial da Ordem das Artes e das Letras”.»
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